- Mãe, tens medo de morrer?
- Não!
- Eu tenho! - respondeu ele.
Confesso que fiquei meio sem rumo, sem saber o que lhe dizer. Mas não o deixei sem resposta e disse-lhe o que achei mais adequado no momento.
A verdade é que, logo depois publiquei a minha inquietude com a questão no facebook e a minha amiga Suzana Pratas, psicóloga, pós-graduada em Psicologia da Saúde, esclareceu-me alguns pontos importantes. Sendo um tema bastante pertinente, de imediato a convidei a escrever um artigo para partilhar com os meus leitores do blog.
Aqui vos deixo o seu artigo.
"S. de 4 anos
pergunta, pela manhã: - Mãe, tens medo de morrer?”
Estas são questões,
cujas respostas, “paralisam” muitos pais, que se questionam, sobre qual a
resposta certa.
Pois é!!!! Não
existe “A” resposta certa.
Existe a resposta
adequada, a cada criança, dependendo da sua idade.
As crianças apercebem-se da separação e da
morte e questionam-se sobre a sua própria existência. Formulam a sua própria
ideia sobre o que é viver e sobre o que é morrer, ainda que tantas vezes não
tenham oportunidade de se manifestar, expor as suas dúvidas, e partilhar os
seus pensamentos e emoções. E também depende da personalidade da criança. Há as
mais extrovertidas, que perguntam tudo. E há aquelas que não fazem todas as
perguntas e preferem descobrir sozinhas. Cada criança é um mundo fantástico a
ser descoberto, todos os dias.
Não
é a morte que verdadeiramente assusta as crianças, é o medo que os adultos têm
da própria morte, que as contagia. Ainda que os adultos, passem esse medo, de
forma inconsciente. Por isso, quando o seu filho falar sobre o assunto, pense
se não falou do assunto com alguém, na presença dele. Ainda que ele lhe
parecesse distraído. Quando digo falar no assunto, não me refiro à morte em si,
mas sim a: zangas com alguém; castigos em alguém; separações de namorados;
divórcios; etc.
O
que uma criança mais teme é a separação. É ficar separada de quem ama. E, em
casos normais, dos seus progenitores ou cuidadores. Não adianta fingir que a
morte não existe. Não adianta tampouco criar essa ilusão nas crianças. Todos
nós vamos morrer um dia! Tudo o que nasce, um dia tem um fim, a morte faz parte
da vida, é uma realidade incontornável. E as crianças, devem saber disso. Mas
cuidado caros pais…depende do desenvolvimento cognitivo de cada criança e tendo
em conta as suas idades. (ver Diferentes idades, Diferentes Ideias)
Os
pais devem ter em atenção, que a criança no seu processo de desenvolvimento
cognitivo, vai tomando conhecimento de determinados ”conceitos” da vida dos
adultos, mas de uma forma gradual. Você que é pai/mãe, com certeza, não tem a
ideia do que é a morte hoje, que tinha aos 5, aos 10 ou aos 15 anos de idade.
Já pensou nisso? Provavelmente nessa idade, pensava que morte era tudo o que
acabava. Não necessariamente tudo o que deixava de ver, sem possibilidade de
rever. E o mesmo acontece com o seu filho(a). Portanto, vamos entender o
desenvolvimento cognitivo das crianças, também de forma gradual.
Para
o efeito, deixo-vos as diferentes formas de como a criança assimila a ideia da
morte, nos seus diferentes estágios de desenvolvimento:
Diferentes Idades, Diferentes Ideias
Cada
criança constrói a sua percepção da morte, que vai evoluindo ao longo da idade.
«Uma criança pode encontrar inúmeros exemplos de morte, por exemplo, numa folha
caída ou num animal morto, e observar que este não se move nem reage a qualquer
estímulo. Isso suscita-lhe curiosidade e ela procura rapidamente uma explicação
junto de um adulto ou de outra criança. A partir dessas explicações ou crenças,
ela desenvolve as suas próprias ideias. Tanto o que lhe é dito, como o que não
se diz (que passa nalguns casos pelo silêncio ou pela fuga à questão), tem uma
grande repercussão no imaginário infantil e no seu desenvolvimento», refere
Abílio Oliveira, no livro Ilusões na Idade das Emoções (F.C. Gulbenkian, 2008).
Em
geral, consideram-se quatro estágios, que se sucedem no tempo, desde o
nascimento até à idade da adolescência. Porém, deveremos ter em atenção, que,
tal como referi no início do artigo, depende de cada criança e nem todas as crianças
passam por todos estes estágios.
Apesar
do S. ter 4 anos, é importante que todos os pais com filhos mais novos e/ou
mais velhos estejam também inseridos neste tema. Assim sendo, irei abordar
desde o estágio de bebé até à adolescência.
Até aos dois anos
A
morte tende a ser entendida como a separação de alguém que lhe é querido (em
especial a mãe ou o pai) e como perda do conforto que sente. O bebé reage à
ausência de uma figura significativa, revelando dificuldade em comer, dormir ou
mesmo manter hábitos de higiene já adquiridos.
Entre os três e os
cinco anos
A
morte é vista como algo temporário e reversível, ou como uma espécie de castigo
que pode terminar a qualquer momento; a criança acredita ter pensamentos
mágicos e que podem “trazer de volta alguém que morreu” ou, pelo contrário,
provocar a morte a alguém; pode sentir-se culpada pelo que aconteceu ou pelo
que não consegue fazer, pois as razões do fim da vida (morte) são mágicas e
misteriosas. Recusa-se a aceitar a morte como o fim, e é incapaz de imaginar a
vida sem o pai ou a mãe, o que por norma faz com que a criança sinta até medo
de morrer e não poder voltar a estar com nenhum dos seus progenitores ou
cuidadores, que são as suas figuras de protecção, sentindo assim, o pânico da
separação e da possibilidade de ficar desprotegido; pode também recear que quem
morreu sinta frio ou fome, que esteja zangado ou triste, ou ficar zangado se
ele(a) não comparecer na sua festa de aniversário, pois, interiormente, ela
continua muito ligada a ele, pois tal como acima referi, a criança não aceita a
morte como um fim. O sentimento de “desprotecção” é o maior causador do medo da
morte e não a morte no conceito que o adulto conhece.
Entre os seis e os
nove anos
A
criança começa a perceber que a morte é permanente e comum a todos os seres
humanos e animais; mas, mentalmente, acredita que ela e os seus familiares, ao
contrário de outros, nunca irão morrer. Nesta idade, a morte é representada
como um monstro, um papão, muito também frequente o interesse pelas causas e
pelo processo de decomposição decorrente da morte, que aprendem na escola em
relação às plantas e animais.
A partir dos dez
anos e até à adolescência
A
morte passa a ser entendida, como um acto final e irreversível. Ou seja, começa
a ser percebida como fazendo parte da vida. As maiores interrogações surgem na
adolescência, com questões ligadas a religiões, a rituais de espiritualidade e
do sentido da vida.
Por
isso, a primeira coisa a fazer, quando o vosso filho(a) vos questionar sobre a
morte, é perguntar-lhe o que é a morte. A partir daí, e depois de algumas
informações que vos deixei aqui, penso que será mais fácil responder. Espero
ter ajudado.
Bem
Hajam.
Suzana
Pratas
Pós
Graduada em Psicologia da Saúde
Obrigada Suzana!
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